segunda-feira, 21 de junho de 2010

Tributo a José Saramago

Neste mundo, onde todos se escondem perante a sociedade alienada, José Saramago era livre. Aprendi que quanto melhor nos conhecemos, maior é a nossa liberdade. Por isso afirmo a sua. O escritor explodia no papel. O seu comportamento era previsível. As suas palavras não. Mas como poderiam o ser? De um bom escritor vem sempre a novidade, o espanto. Uma maré cheia de novos pensamentos que, sendo novos, não deixam, ainda assim, de ser adjectivados pela coerência.

É na escrita de Saramago que tudo fica. Palavras imunes ao tempo. A voz que as profere ecoa na nossa memória. Só um grande escritor consegue fazer com que a sua escrita se mantenha viva para a eternidade. Não tenho dúvidas que Saramago o conseguirá. Porém, há que acrescentar que não se é um grande escritor sem se ser, primeiro, um grande homem. Pouco ou nada conheço da vida do autor de Memorial do Convento, mas de uma coisa estou certa: ele era um grande homem. Dos poucos que dizia o que lhe ia na alma sem ter medo das consequências; verdadeiro, sincero, honesto, inteligente. Foi criticado pelo que escrevia cá, foi para Espanha e em Portugal continuaram as críticas. O espelho do nosso conservadorismo.

O que importa é que este senhor foi homenageado em vida. Não acho que colocá-lo ao lado de Fernando Pessoa seja exagero da minha parte. Ambos deram um enorme contributo para a cultura do nosso país e fizeram correr muitas lágrimas ao povo português. Pessoa depois de morto, Saramago ainda em vida. É aqui , neste lugar, que todos deviam ser galardoados pelo seu trabalho. Nada sabemos sobre o que há para além disto. O autor, falecido no passado dia 18 de Junho, recebeu o prémio Nobel da Literatura em 1998 e obteve o mais importante prémio português, o prémio Camões. Os meus profundos e sinceros parabéns, senhor José Saramago! Resta agora homenageá-lo e falar de si como você merece: com todo o respeito e admiração.

Ironias da vida! Confesso que a primeira vez que li o Memorial, na minha instável adolescência, achei que não iria conseguir chegar ao fim depois de terminar as duas primeiras páginas. Ao fim cheguei, mas foram muitas as vezes que tive de voltar atrás para perceber o contexto, quem falava, o que dizia… A segunda vez que li a obra já foi diferente. Porque não a li. Devorei-a! Tempos depois, deliciei-me com O Ano da Morte de Ricardo Reis e as Intermitências da Morte. É com um parágrafo desta última obra que me fico.

«A morte afogou as cordas do violoncelo, passou suavemente as pontas dos dedos pelas teclas do piano, mas só ela podia ter distinguido o som dos instrumentos, um longo e grave queixume primeiro, um breve gorjeio de pássaro depois, ambos inaudíveis para ouvidos humanos, mas claros e precisos para quem desde há tanto tempo tinha aprendido a interpretar o sentido dos suspiros.»

José Saramago era livre. José Saramago É livre!

Sara Gonçalves.

4 comentários:

  1. BRAVO!
    Uma das minhas maiores referências! Felizmente, tive a oportunidade de lhe prestar a minha homenagem, deixando-lhe um cravo branco junto à sua urna. Lamento não ter podido conhecê-lo pessoalmente, mas tenho grande parte da sua obra para ler.
    Um bem-haja pela homenagem, Sara.

    E sim, as férias estão a correr bem. = )
    Beijinhos.

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  2. Bem-haja a ti, Samuel, pelo bonito gesto ao levares um cravo a este grande senhor e, ao contrário do que muitos pensam, grande português!
    Beijinhos e continuação de boas férias!

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  3. Julgo que se devia ter esforçado mais por justificar algumas afirmações que fazia frequentemente: comparar os israelitas e os americanos aos nazis, por exemplo. Se tivesse feito esse esforço de justificação perceberia logo que eram falsas e injustificáveis.
    Seja como for, o 'Memorial do Convento' é um grande romance.

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  4. Querida Sara
    Gostas mais do Saramago do que ele certamente gostaria de ti....
    E eu, sem qualquer dúvida, gosto muito mais de ti do que do Saramago...
    Xinhos e continua a escrever....
    O amigo
    Artur Costa

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