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domingo, 26 de fevereiro de 2012

Antevisão aos Óscares 2012


Fonte da imagem:http://entretenimento.r7.com/cinema/noticias/o-artista-e-os-descendentes-sao-favoritos-dos-criticos-20111212.html

Este ano revela-se favorável para os críticos do cinema de Hollywood fazerem-se ouvir. Mais do que nunca. Acontece que todos os candidatos ao Óscar de melhor filme são bons, mas não o suficiente para estarem nesta corrida. Talvez o que se aproxime mais do protótipo que tal estatuto reivindica seja O Artista, de Michel Hazanavicius. Não pela sua mudez (este filme não é mudo; aparecem, inclusivamente, vozes no final), mas sim pela forma como nos prende a atenção durante quase uma hora e trinta minutos e, claro, pela sua música. A banda sonora é encantadora!!! Destaco o maravilhoso cão da personagem George e vergo-me perante a cena extremamente comovente em que ele implora com os seus olhos para que o dono não cometa suicídio. Outro tributo ao cinema é A Invenção de Hugo que, a meu ver, ficou aquém das expectativas (talvez não devesse, pessoalmente, ter-lhe depositado tantas). Não obstante, acho curioso estarem a lutar pela estatueta dois filmes que exaltam a sétima arte (sem nunca chegar aos calcanhares do delicioso Cinema Paraíso, vencedor de um óscar para melhor filme estrangeiro, em 1990). Em relação aos restantes nomeados, e apesar de já aqui ter declarado que nenhum merece ganhar, gostei de todos (até de Moneyball, que não faz de todo o meu género), mas quero sublinhar outros dois que, de certa forma, me tocaram: o primeiro é A Árvore da Vida, que me parece ser realmente uma obra-prima pela sua fotografia. Ao longo da narrativa, vemos um bebé crescer no ventre da mãe, vemos o planeta Terra no espaço, vemos uma árvore no meio do deserto, vemos cor, luz, sentimos dor, sofreguidão e, à medida que tudo isto acontece, ouvimos o nosso coração bater com uma celeridade cada vez maior, apesar da estranha calma em que parecemos estar embebidos. Sim, este filme suscita esta contradição: faz-nos parecer que nada mudou, mas, à medida que as cenas passam, nós estamos, efetivamente, a mudar. Este jogo é, no mínimo, brilhante! Advogo também que Brad Pitt não deveria ter recebido a sua nomeação por Moneyball, mas sim por esta última obra referida. O segundo filme que destaco é Cavalo de Guerra, de Steven Spielberg (que, este ano, está de parabéns por ser o produtor com mais nomeações na corrida). Gostei particularmente desta película por revelar o amor e a devoção que podem existir entre um homem e um animal que lutam, vencem e, por fim, têm a maior de todas as recompensas: um reencontro já nos términos da I Guerra Mundial. No que toca aos restantes filmes (já escrevi um artigo neste blogue sobre Meia-Noite em Paris, pelo que não vou voltar a dar a minha opinião sobre este filme), posso desde já afirmar alguma desilusão em relação a Os Descendentes: George Clooney faz, de facto, um ótimo papel (a sua imagem no hospital, a falar com a mulher que se encontrava em coma, ficou-me na memória pela sua densidade e carga psicológica) e talvez mereça o óscar, mas o filme não merece. O resultado final pareceu-me um pouco banal (talvez a culpa seja do cenário hawaiano). Antes de terminar, há que referir também o extraordinário papel que desempenham todas as atrizes de As Serviçais e, muito particularmente, o jovem ator de Extremamente Alto, Incrivelmente Perto, Thomas Horn. Estava expectante em relação a este filme por entrarem dois artistas por quem nutro uma grande estima: refiro-me a Tom Hanks e Sandra Bullock. Acontece que o papel desta criança que luta incansavelmente para descobrir o que abrirá uma chave deixada pelo seu pai, falecido no ataque do 11 de Setembro às torres gémeas, no bolso de um casaco, abafa todos os outros. Avassaladora, como seria de esperar, é também a interpretação de Meryl Streep no papel de Margaret Thatcher, em A Dama de Ferro. Veremos se é este ano que a minha atriz predileta arrecada o seu segundo óscar de melhor atriz principal. Espero que sim. Desejo ainda, e acima de tudo, que o espetáculo de amanhã no Kodak Theatre seja melhor que o transato.


Sara Gonçalves

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

"Meia-Noite em Paris", de W.Allen


Pergunto-me o que torna Paris tão especial. Uns preferem-na diurna, outros noturna (os amantes da vida boémia, em particular). O protagonista do novo filme de Woddy Allen prefere Paris à chuva.

De dia, de noite ou à chuva, penso (sem nunca lá ter ido) que Paris é sempre especial.

Meia-noite em Paris prova isso mesmo. O filme enceta com imagens arrasadoras da cidade. Ouvi alguns «uau!» no cinema durante os primeiros minutos. Eu própria estava encantada (confesso que só me apetecia saltar para dentro do ecrã e ser uma das personagens! Pisar aquele chão ter-me-ia dado quilogramas de felicidade!).

Depois de um delicioso passeio virtual, a história. Um escritor, noivo de Inez, uma mulher rica e atraente, arrisca escrever um romance em vez dos seus já habituais guiões cinematográficos. Todas as noites, quando toca o sino da igreja anunciando as doze badaladas, Gil apanha uma carruagem que o leva até aos anos 20 parisienses, um poço de inspiração, época de grandes vultos como Ernest Hemingway, Gertrude Stein ou Pablo Picasso. Aí conhece Adriana, personagem que surge enquanto amante do pintor anteriormente citado, por quem o escritor se apaixona profundamente. Acontece que Gil troca Inez pelos anos 20 e Adriana acaba por trocar Gil pela Belle Époque. Mas não, não se apoquentem. No final, surge um novo amor – e este no presente.

Resumindo: Allen sai de cena com uma verdadeira obra-prima. Os meus parabéns pela inteligência, perspicácia e elegância com que construiu Meia-Noite em Paris.

C’est suprême!


Sara Gonçalves

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Os Jovens Portugueses e a Leitura

«Há mais jovens a considerar que a leitura é importante para a sua vida pessoal. Em 2007, entre os que tinham 15 a 24 anos, 30,6% consideraram-na "muito importante". Em Março passado, neste grupo etário, já eram 52,4% os que afirmaram o mesmo. Este aumento de 22 pontos percentuais regista-se entre o primeiro e o quinto ano de vigência do Plano Nacional de Leitura (PNL), frisa-se no relatório de avaliação externa daquele programa, que será hoje apresentado em Lisboa.»

Foi esta a notícia lançada hoje pelo jornal Público acerca de um inquérito desenvolvido em Março deste ano, que contou com uma amostra de 1257 indivíduos.

De entre os vários comentários online feitos pelos leitores do diário a esta notícia, gostaria de mencionar um em particular: «O que me preocupa verdadeiramente é o facto de 47.6% dos jovens entre os 15 e os 24 anos não achar a leitura muito importante…». Caríssimo Miguel, de Paço de Arcos, concordo consigo. Ainda que inferior, este segundo número pesa mais.

A leitura tem inúmeras vantagens: estimula o cérebro, aumenta a nossa capacidade de raciocínio, torna o ser humano mais criativo e o seu discurso mais rico. Infelizmente, muitos são os que não vêem estas vantagens e pensam que a fórmula matemática da leitura de um bom livro é a subtracção (ou tempo perdido) e não a soma (ou conhecimento adquirido).

Talvez o principal problema dos jovens, em geral, seja a ausência de estímulo. Muitos são os encarregados de educação que preferem assistir a uma telenovela depois de jantar do que ler O Primo Basílio. Têm toda a legitimidade para o fazer. Contudo, o facto de os mais velhos não gostarem de ler Eça de Queirós não implica necessariamente que não possam ajudar os filhos na busca pelos encantos da leitura. Contar uma história antes de adormecer, ir a uma feira do livro ao Domingo à tarde ou comprar o semanário são encorajamentos que não dão muito trabalho e podem, um dia, gerar bons frutos.

É entre os 15 e os 24 anos que se solidificam as identidades. Por isso, não é demais pedir que, num próximo inquérito, o número de jovens que considerem a leitura importante para a sua vida pessoal seja bastante superior. Ficar satisfeito com a maioria é cruzar os braços.


Sara Gonçalves

quinta-feira, 10 de março de 2011

A Revolta do Presidente

A tomada de posse do nosso Presidente da República foi marcada por um discurso proferido num tom a que Cavaco Silva nunca antes nos tinha habituado. Pacifismos à parte, não escondeu o seu descontentamento com o Governo de Sócrates e ainda apelou à massa juvenil que se faça ouvir. "Ajudem o vosso país." "Façam ouvir a vossa voz. Este é o vosso tempo." Ficámos todos sem perceber se esta foi uma estratégia para levar da malta jovem uns quantos sorrisos ou se o nosso PR quer mesmo ver a força de uma «geração à rasca» no próximo Sábado, dia 12 de Março. No entanto, Cavaco Silva, que tem, no fundo, o difícil e ingrato papel de voz da vontade geral, deveria prestar mais atenção à forma como pronuncia a sua opinião. Não nos esqueçamos que nem sempre as manifestações de jovens correm bem, gerando-se muitas vezes violência e, com ela, graves acidentes (não que não concorde com a iniciativa, aliás, concordo e farei parte dela. Se não for ao Porto, mostrarei o meu descontentamento aqui mesmo em Braga. Simplesmente apelo ao bom senso do povo…). A questão que se levanta é esta: até que ponto é que um PR deve apelar à manifestação? Dizer que nós, jovens, somos parte da solução? O que é que podemos fazer? Não somos nós que governamos o nosso país. É o Governo. E no Governo está Sócrates que tem conseguido manter o seu cargo de primeiro-ministro, porque os anjinhos do céu o dotaram de um enorme poder oratório (ainda que o seu campo lexical seja apenas constituído, como diz um professor meu - e bem! - por cinquenta palavras.) Poderíamos ansiar pela queda do PS e por um PSD governante. Porém, isso já todos sabemos que seria (e infelizmente temo bem que será) mudar de cavalo para burro. Não, obrigada! O que fazer então? Para já, vamos manifestar-nos, sim. Mas, vamos, sobretudo, reflectir. Só depois de meditar sobre os assuntos devemos passar à acção. O mal dos nossos políticos é que não usam devidamente a razão antes de dizer disparate (pensar dá trabalho!). Assim já não corremos o risco de entrar nas «Jotinhas» e ir para a AR fazer figuras tristes. Até lá (eu pessoalmente dispenso bem uma carreira política, mas sei que muitos colegas meus fariam um bom trabalho), temos de levar com a malta que pusemos no poder. Sim, fomos nós que os pusemos. E porquê? Bem, posso dizer-vos qual foi a resposta do meu avô quando lhe perguntei o motivo pelo qual fala tanto mal do PM e foi votar nele: «Pá, o gajo fala bem!...». E mais não digo. Também como diz o meu professor, ficámos cansados de ter ido à Índia há uns séculos atrás. E gastar todo aquele ouro do Brasil foi dose (esta é minha)! Recuperar é um processo que leva o seu tempo. Caros leitores: atentem bem nestas minhas últimas palavras…

Sara Gonçalves

quinta-feira, 3 de março de 2011

"O progresso das ciências e das artes contribuiu para o progresso da Humanidade?"

“O progresso das ciências e das artes contribuiu para o progresso da Humanidade?”. Esta foi a questão levantada pela Academia de Dijon, a qual Jean-Jacques Rousseau tentou esclarecer com a sua obra Discurso Sobre a Origem e Fundamento da Desigualdade entre os Homens, de 1754. Logo de imediato, a resposta do filósofo suíço à pergunta é negativa. Tudo o que diz respeito à ciência e à arte em geral diz respeito à vida do homem em sociedade e, portanto, é artificial. Há uma clara dicotomia entre “ser” e “parecer” no discurso rousseauniano: tal como uma peça de teatro, na vida social o “parecer” ou persona (palavra latina que significa o disfarce ou a aparência exterior de um homem, imitada no palco) sobrepõe-se ao “ser”. Já Thomas Hobbes (talvez o autor que Rousseau mais contesta) dizia, no Leviatã, que uma pessoa «é o mesmo que um actor, tanto no palco como na conversação corrente. E personificar é representar, seja a si mesmo ou a outro.» Sucede que um homem no seu estado primitivo, chamemos-lhe assim – sendo bom ressalvar que o estado de natureza em Rousseau é inexistente ou, melhor, é apenas uma hipótese que deve servir como a referência que permite julgar moralmente a degradação do homem social - goza de um petite naturelle, uma espécie de instinto ou atitude de respeito pelo outro. Diríamos mesmo um certo tipo de compaixão. É precisamente isto que está na base da gestação dos sentimentos naturais. Contudo, ao encontrar-se já na dita sociedade civil, os homens abandonam o amor-de-si, uma tendência para a sua autoconservação (o conatus espinosista) e abraçam o amor-próprio, o egoísmo ou princípio de exclusividade. O homem, que havia nascido livre, vive agora, em toda a parte, aprisionado. É desta forma que Rousseau enceta o seu Contrato Social, precisamente para mostrar que o “bom selvagem” acaba por dar lugar ao homem escravizado. E se a moralidade nasce das paixões e dos sentimentos naturais, o vício ocorre como um desvio da própria natureza. No fundo, Rousseau afirma que os homens moralmente mais valiosos são os mais simples, aqueles que desconhecem a exuberância e vivem nos campos, colhendo flores e regozijando-se com o calor do sol. Ainda assim, o ser humano é dotado de uma capacidade de aperfeiçoamento que pode possibilitar um reencontro com o seu eu primitivo. Para isso é necessário que todo o homem oiça a voz da verdade, ou seja, deixe que a razão desperte para depois o coração falar e/ou levar à acção. Se para Immanuel Kant havia duas coisas que lhe enchiam a alma de espanto - o céu estrelado acima de si e a lei moral dentro de si, sendo que o primeiro se deve submeter à segunda, para Rousseau o coração deverá subordinar-se imperativamente à razão. Fernando Dias, no seu blogue A Fisga [podem aceder ao artigo que referimos neste texto aqui: http://ferndias.blogspot.com/2011/03/coerencia-cardio-cerebral-sinergia.html], refere uma harmonia necessária entre o cérebro e o coração com vista a uma vida boa. O médico vai ainda mais longe afirmando que «é pouco sensato desprezar o coração através de um exagerado encantamento pelo cérebro. O coração também pensa, embora obviamente não racionalmente como o cérebro. É mais certeiro Pascal com a frase: “o coração tem razões que a razão desconhece”. Isto chama a atenção para a inteligência intuitiva, e o contributo que o coração dá para ela. E de facto, se reparamos no sentido da palavra “palpite”, como, por exemplo, quando desconfiamos que algo não está a bater certo, verificamos que a palavra deriva do palpitar que sentimos no peito nessas circunstâncias.» Pensámos por bem referir aqui esta passagem uma vez que a dita remete novamente a nossa atenção para o cerne do problema levantado pela questão da Academia com a qual encetámos o nosso texto. De facto, Rousseau rejeita a ciência e as artes, mas a verdade é que ambas contribuem, sim, para o desenvolvimento da Humanidade, cada uma, claro está, à sua maneira. Seja no campo da astronomia, onde um bom astrónomo se deixa levar pela sua intuição de forma a tentar descobrir novos corpos no sistema do universo, seja no campo da poesia, onde qualquer grande poeta usa a razão e o coração para escrever o que lhe vai, de momento, na alma, há sempre uma tentativa de conciliar mente-corpo por forma a levar a cabo um determinado tipo de acções. Já para não falar que, em qualquer ciência ou em qualquer arte, deparamo-nos com um enorme talento por parte dos seres humanos que evoluem, quanto mais não seja por se tornarem em si mesmos seres um pouco mais realizados. Se o palpitar que possibilita aos homens construírem mundo (um quadro, por exemplo, é mundo) não é progresso, então, o que é?

Sara Gonçalves