quinta-feira, 14 de abril de 2011

A Metempsicose na Série "Perdidos"

No 16º episódio da primeira temporada de Lost, Sawyer apercebe-se que anda a ser perseguido por um porco. Depois de ter sido atacado pelo animal duas vezes, a personagem parte à sua procura, querendo, obviamente, vingar-se. É então que o porco o irrita pela terceira vez quando remexe nas suas coisas durante a noite, enquanto Sawyer dormia. Porquê falar disto?

Atentemos no discurso que Locke profere a Sawyer quando toma conhecimento do sucedido:

«A minha irmã Jeannie morreu quando eu era um rapazinho. Caiu na jaula dos macacos e partiu o pescoço. A minha mãe… bem, a minha mãe adoptiva culpou-se, claro. Pensou que não estaria a observá-la suficientemente de perto. Então, parou de comer, parou de dormir. Os vizinhos começaram a comentar, temendo que ela tentasse alguma coisa… Seis meses depois do funeral da Jeannie, uma cadela de caça dourada veio pela nossa rua, entrou dentro da nossa casa, sentou-se no chão e olhou directamente para a minha mãe, que estava no sofá. E a minha mãe olhou de volta para a cadela. Depois de um minuto a olharem-se, a minha mãe caiu em lágrimas. Bonita cadela, sem marcas, sem coleira. Saudável e dócil. A cadela dormia no antigo quarto da Jeannie, na cama da Jeannie. E ficou connosco até a minha mãe morrer, cinco anos depois. Depois, desapareceu para onde quer que tenha vindo...»

No fundo, a personagem Locke quer dizer a Sawyer que a sua mãe acreditava que Jeannie era a cadela, que teria voltado para lhe dizer que parasse de se culpar a si própria pelo que acontecera. O porco que encarara Sawyer quereria, possivelmente, o mesmo. Estamos, portanto, a falar da teoria da metempsicose ou transmigração das almas que remonta à escola pitagórica (de Pitágoras, o filósofo que marcou essencialmente pela sua visão matemática com a afirmação de que «tudo é número», e dos seus discípulos), da Antiguidade Grega.

Em poucas palavras, a metempsicose afirma que a alma é um demónio atirado para a prisão do corpo e que, após a morte, separa-se deste para se ir purificar ao Hades; depois, regressa à terra para habitar um novo corpo. Durante essas transmigrações, as almas expiam as faltas que cometeram na existência anterior; quando são consideradas dignas de serem libertadas do ciclo das existências, conhecem uma vida divina imortal. Por isso, a escola pitagórica ficou conhecida pela interdição de qualquer alimento animal. O motivo é óbvio: os seus seguidores receavam poder comer o corpo de um parente ou de um amigo reencarnado. Pitágoras, por exemplo, proferiu, certa vez, as seguintes palavras: «Pára, não lhe bata mais, porque é a alma de um amigo que eu reconheci, ao ouvir a sua voz.»

Seria, no mínimo, diabólico pensar esta teoria como sendo verdadeira. Ainda assim, Sawyer, ao encontrar o porco fugitivo e ao encará-lo com uma pistola na mão direita, nada fez. A personagem deixou que o animal se fosse pura e simplesmente embora.

O conhecimento humano é limitado. Essa limitação não nos permite fazer juízos acerca de uma teoria como aquela que aqui foi apresentada. Tão-pouco sabemos se a alma, de facto, existe. Por via das dúvidas, como diz o povo, mais vale prevenir que remediar!


Sara Gonçalves

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